quarta-feira, dezembro 18

Tédio de morte

Tédio predomina. Tédio, tédio, tédio.
Não tenho porra nenhuma pra fazer. Nem matar quero hoje. Assassina entediada, pode? Talvez, se eu trocar os objetos dos meus crimes. Estou entediada de matar o tempo. Pensei em infanticídio, parricídio não dá por que já fizeram o trabalho por mim. Cachorrocídio, gatocídio, borbolocídio... não me importo se essas palavras não existem, o tédio é tanto que estou me sentindo aquele escritor que inventava palavras, qual o nome dele?
Preciso matar alguma coisa. O próximo que passar pela minha frente. Maldito azarado.
Peguei a chave do carro, botei um forrozão e fui estrada afora. Vento no rosto, sangue no zóio. Matar, matar, matar, matar. E um imbecil pede carona. Claro que eu dou. É hoje!
O nome dele era Carlos, 24 anos, órfão, olhos azuis. Dei pra ele, não matei. Droga.
Virei o carro, depois de deixar ele em casa e me perdi. Isso mesmo, não sabia mais como chegar em casa, fui parar numa favela. Fui roubada. Não matei ninguém, aliás, chorei e implorei pra não ser morta. Humilhante.
Até aí o tédio tinha passado, estava com medo do caralho. Dei de cara com uma mulher-macho que achou que eu precisa de proteção e de ser bolinada, quase fui estuprada. Eu até gostei, mas na hora que deu uma brecha saí correndo que nem o diabo. Caí numa vala de esgoto. Gente, meu tédio numa hora dessa, estava até com saudade. E a vontade de matar? Só o tempo estava bom demais.
Depois do meu fedor, ninguém chegou perto. Ri sozinha. Que merda, literalmente. Começou a chover. Dei boas vindas à água. Providencial.

Continuei andando. Saí da favela e entrei numa área residencial. Isso era de madrugada já. Onde estava não sei, deitei esgotada perto de um portão e cochilei. Acordei com um chute na costela. Doeu hein? Puta merda. Nem gemi, tamanha dor. Gritaram pra eu ir dormir em outro lugar, etc. Tentei argumentar, pedir informação, qualquer coisa. Levei um soco na cara. Acordei na delegacia. Fiquei aliviada, até descobrir que estava sendo acusada de roubo. Vê se pode. Demorou séculos pra esclarecer minha situação. Quando cheguei de volta ao meu muquifo, estava morta. Que reviravolta. Tédio seja abençoado. A partir de agora, nada de dar carona pra ninguém, matar tudo bem.


E aí, entediado?

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